terça-feira, 26 de julho de 2011

CONTRIBUIÇÕES DA OBRA “A INVENÇÃO DA CULTURA” DE ROY WAGNER PARA PESQUISA DOS TRABALHADORES RURAIS DA VILA DE SÃO JOSÉ DO ITAPORÃ-BA.

Por: Alex de J. Oliveira
Mestrando em Ciências Sociais/UFRB


RESUMO
O paper pretende demonstrar as contribuições da obra “A invenção da Cultura” de autoria do professor Roy Wagner para o desenvolvimento da pesquisa a questão da terra no recôncavo baiano: memórias de tempos de enfretamentos pela posse de terras na Vila de são José do Itaporã – BA / 1970 a 2000.

PALAVRAS CHAVES: cultura, antropologia, etnografia.

Por: Alex de J. Oliveira
INTRODUÇÃO

O nosso anteprojeto de pesquisa traz como proposta estudar os trabalhadores da Vila de São José do Itaporã a partir de suas memórias e cultura. Queremos compreender como esses homens e mulheres conseguiram permanecer no campo em um momento de grandes mudanças no Recôncavo baiano nas décadas de 1960 a 2000.
Para tanto acredito ser necessário demonstrar o que pretendo pesquisar para poder relacionar com o texto “A invenção da cultura” estudado na disciplina problemas e paradigmas da investigação social.
O nosso anteprojeto tem como foco a problematização da questão da terra no Brasil, pois essa temática tem sido discutida em debates acalorados que tem se desdobrado em movimentos sociais organizados em nossa sociedade como o MST .
Neste sentido, a escolha do tema representa uma oportunidade de colocar em evidência na academia um objeto de estudo significativo para os trabalhadores rurais da Vila de São José do Itaporã – BA, bem como para sociedade do Recôncavo Sul baiano.
A posse da terra em nosso país é um problema de tamanha relevância para nossa sociedade que perpassa toda a História do Brasil como um dos maiores entraves para a construção de uma sociedade que possibilite o mínimo de dignidade para os seus cidadãos.
No Brasil a questão da posse de terras devolutas remonta ao século XVIII . Sabe-se que a Lei de Terra aprovada em meados do século XIX não evitou que o posseiro adquirisse terras, como bem nos esclarece Barickman quando ele afirma que “a Lei de Terras, finalmente aprovada em 1850, mostrou-se completamente ineficaz para controlar a aquisição de terras devolutas por particulares no Recôncavo baiano”.
O fato é que os herdeiros dos primeiros posseiros, no inicio do século XX tinham muitos filhos, e ao falecer deixavam suas terras também como heranças. O número de filhos implicava em ter que deixar pequenas extensões de terras para os mesmos, os quais tinham duas alternativas; vender as terras e migrar para as cidades ou resistir a vender suas terras e criar estratégias de sobrevivências em meio às agruras do trabalho duro na roça .
Por conseguinte, em 1964 o governo militar editou o Estatuto da Terra (Lei nº. 4 504/64) para consolidar a regulamentação do uso e ocupação da terra no Brasil. Porém, essa lei não resultou em melhorias na vida do pequeno proprietário, ao contrario ela possibilitou que os fazendeiros agropecuaristas do Recôncavo angariassem empréstimos nas instituições financeiras que os permitiam comprar as terras dos herdeiros interessados em vender suas posses.
Portanto, queremos identificar e analisar a partir das memórias e da cultura dos trabalhadores rurais da Vila de São José do Itaporã - BA como eles construíram estratégias para permanecer em suas “terras” mesmo tendo ínfimas extensões que mal lhes permitia retirar o sustento para suas famílias.

1.1 CONTRIBUIÇÕES DA OBRA “A INVENÇÃO DA CULTURA” DE ROY WAGNER PARA PESQUISA DOS TRABALHADORES RURAIS DO SÃO JOSÉ DO ITAPORÃ.

Por se tratar de uma pesquisa onde a observação participante será de grande importância entendemos que o trabalho de Roy Wagner tem significativa relevância para nos ajudar a compreender o fazer etnográfico, na medida em que suas colocações nos alerta para visualizar a nossa inserção enquanto pesquisador na construção do objeto estudado. Para Wagner:
O fato de que o antropólogo opta por estudar o homem em termos que são ao mesmo tempo tão amplos e tão básicos, buscando entender por meio da noção de cultura tanto sua singularidade quanto sua diversidade, coloca uma questão peculiar para essa ciência (...) O antropólogo é obrigado a incluir a si mesmo e seu próprio modo de vida em seu objeto de estudo, e investigar a si mesmo (...) O antropólogo usa sua cultura para estudar outras e para estudar a cultura geral.

Como se pode notar, para Wagner o fazer etnográfico nos impõe a obrigatoriedade de termos consciência da nossa participação na construção do objeto e vai mais além, na medida em que demonstra que o pesquisar quando estuda outra cultura acaba transformando a sua própria cultura também em objeto da investigação.
Estudar a “cultura” rural, a vida, os costumes, valores, o modos de vida do povo de São José do Itaporã, bem como sua relação com a terra também será de certo modo compreender melhor como dimensionalizo a cultura na qual estou inserido a saber; a cultura urbana do recôncavo.
Outro ponto que acreditamos ser fundamental para compreender melhor o cotidiano dos agricultores do São José do Itaporã é o cuidado de não querer alcançar a objetividade absoluta durante a pesquisa e ao analisar os dados levantados, pois para Wagner o antropólogo:
Precisa renunciar à clássica pretensão racionalista de objetividade absoluta em favor de uma objetividade relativa, baseada nas características de sua própria cultura. É evidente que um pesquisador deve ser tão imparcial quanto possível, na medida em que esteja consciente de seus pressupostos; mas freqüentemente assumimos os pressupostos mais básicos de nossa cultura como tão certos que nem nos apercebemos deles.

Neste sentido o pesquisador deve ter em mente que de maneira nenhuma conseguira da conta de forma totalmente imparcial do seu objeto de estudo. A objetividade absoluta do seu objeto de estudo é uma utopia, pois para sua efetivação seria necessário que o pesquisador não tivesse cultura. É inevitável que a cultura do pesquisador não influencie na sua pesquisa. Não obstante, isso não implica que o cientista social não busque a imparcialidade.
Visualizar a cultura do povo de São José do Itaporã será de certo modo uma forma de nos tencionar no sentido de levar-nos a verificar não só as especificidades dos modos de vida desses trabalhadores rurais, mas compreender melhor a cultura na qual estamos inseridos. O que Wagner nos chama atenção é para o afastamento da ingenuidade de acreditar na possibilidade da imparcialidade total do pesquisador, o que de certo modo é impossível.
Para Wagner o pesquisador é o elo entre duas culturas, pois vivência ambas no processo de pesquisa de campo. Para ele é essa consciência que permite o cientista social conseguir captar elementos que podem ser descritos e explicados da cultura estudada. Em suas palavras ele diz ;
Para que o pesquisador possa enfrentar o trabalho de criar uma relação entre tais entidades, não há outra maneira senão conhecer ambas simultaneamente, aprender o caráter relativo de sua cultura mediante a formulação concreta de outra. Assim é que gradualmente, no curso do trabalho de campo, ele próprio se torna o elo entre culturas por força de sua vivência em ambas; e é esse “conhecimento” e essa competência que ele mobiliza ao descrever e explicar a cultura estudada.

Conviver com os trabalhadores do São José do Itaporã na pesquisa de campo teremos a consciência que somos um “elo” entre “mundos” tão próximos que fazemos parte de uma mesmo – povo brasileiro – mas que temos formas de nos relacionar diferenciada tanto com a natureza quanto uns com os outros. Entender que o cientista dentro do processo de pesquisa de campo é um elo entre duas culturas facilitara o entendimento melhor do outro, e a assimilação do choque cultural se dará de uma forma mais branda.
Sobre a construção do conhecimento após a pesquisa de campo Wagner diz que será necessário que o antropólogo tenha habilidades para produzir significados dentro de sua própria cultura para tentar explicar e tornar inteligível a cultura estudada para os seus pares. Ele diz os esforços do antropólogo:
para compreender aqueles que está estudando, para tornar esse conhecimento a outros irão brotar de suas habilidades para produzir significados no âmbito de sua própria cultura. Desse modo, o que quer que ele “aprenda” com os sujeitos que estuda irá assumir a forma de uma extensão ou superestrutura, construída sobre e com aquilo que ele já sabe. Ele irá “participar” da cultura estudada não da maneira como um nativo o faz, mas como alguém que sesta simultaneamente envolvido em sue próprio mundo de significados, e esses significados também farão parte.

Estudar a cultura, os relacionamentos dos trabalhadores rurais do São José do Itaporã, suas vivências, modos de vida, sua resistência em sair de suas terras, seus significados e representações em relação a terra, só se tornarão inteligíveis para meus pares dependo das “metáforas” que utilizemos dentro do nosso “campo cultural”. É capacidade de analise dos dados dentro do “campo cultural” que estou inserido que promoverá a construção de um conhecimento coerente sobre o povo em estudo.
Neste sentido, isto implica em dizer que o discurso científico produzido será resultado da colaboração de elementos de duas culturas que simetricamente se tencionam e se estudam e, por conseguinte, produzem significados sobre si mesmas transformando o pesquisador no “instrumento” captador dessas tensões de modo a ser capaz de falar do outro falando com ferramentas ( linguagem) que pertencem a sua cultura.

CONCLUSÃO


As contribuições de Roy Wagner para nortear o nosso processo de investigação, principalmente em relação ao trabalho de campo e a noção de cultura é fundamental, pois nos mostra de forma profunda a inserção do pesquisador e de sua cultura dentro do fazer etnográfico.
Wagner apesar de ser radical em alguns momentos, sobretudo em relação a existência de uma certa objetividade na pesquisa, ele não deixa de demonstrar as variáveis que transformam o objeto a ser estudado em participante dentro do processo de construção do conhecimento. Ele não nega a possibilidade de se conhecer outra cultura, apenas diz como se da esse conhecimento, a saber; dentro de um jogo de invenção de si mesmo e do outro, ou seja dentro da invenção da cultura do outro a partir da cultura de quem busca estudar e acaba estudando também a si mesmo.
A epistemologia de Wagner sobre o conceito de cultura nos alerta para a possibilidade da invenção desse conceito dentro da pesquisa de campo quando se da o choque cultural entre as partes envolvidas no processo de construção desse conhecimento – o pesquisador e seu objeto. Ele também alerta sobre como se da produção desse conhecimento após a pesquisa, mostrado que para que o trabalho tenha sentido para o pesquisador e seus pares é necessário que o mesmo tenha habilidade dentro do campo cultural em que esta inserido de modo a ser capaz de tornar inteligível o seu discurso.
O trabalho de Roy Wagner nos esclarece muito sobre o fazer etnográfico. As suas colocações apesar de radicais em relação à cultura traz elementos importantes para o entendimento deste conceito. Sobre a pesquisa de campo - in locus – Wagner se constitui leitura obrigatória e acabou por ajudar a desenvolver uma visão mais apurada sobre o objeto de nossa pesquisa.


REFERÊNCIAS

BARICKMAN, B. J. Um Contraponto baiano: Açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-1860 – RJ: Civilização brasileira, 2003.

LEWIN, H.(ORG.) Uma nova abordagem da questão da terra no Brasil: o caso do MST em campos dos Goytacazes. Rio de Janeiro, 7letras, 2005.

OLIVEIRA, A. J. Experiências, Cotidiano e Representações dos Trabalhadores Rurais de São José do Itaporã - 1960 / 1990. Monografia apresentada na conclusão do curso de Especialização em História Regional e local – UNEB/Campus V - digitada e deposita na Biblioteca do Campus V.

OLIVEIRA, A. M. C. S. Recôncavo Sul: terra, homens, economia e poder no século XIX. Salvador-Ba: UNEB 2002.

WAGNER, R. A Invenção da Cultura. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário